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quarta-feira, 12 de outubro de 2011

CONTO - CAÇA E CAÇADOR


SAUDAÇÕES VIAJANTES!

Caça e caçador

Tristan acendeu mais um cigarro. Já era o terceiro em menos de 10 minutos. Mas não fazia diferença. Aquilo não envenenaria seu corpo, ou mataria seu pulmão. Esse tipo de substancia já não era mais nociva a sua carcaça amaldiçoada. Na verdade, não havia prazer algum ao tragar o cigarro. Era puramente psicológica a sensação de calma que o cigarro proporcionava. Nunca fora um fumante “religioso” quando vivo, fumava apenas antes de situações em que seus nervos ficariam a flor da pele.
Somente quando a ansiedade lhe atacava violentamente. Tinha certa preocupação com a saúde apesar de tudo. Mas agora nada disso importava. Era um ser de trevas em uma carcaça condenada a vagar eternamente pela escuridão. Agora era um maldito sangue suga, um cruel matador, caçador de seres humanos. Um vampiro. Não teve muito problema em se adaptar desde que fora trazido para esta vida noturna. Quando se começa a enxergar seres humanos como gado, fica fácil degustá-los como se fossem hambúrgueres do Mc Donald.
Logo se vai a culpa e todo sentimento de moralidade e fica mais fácil aceitar a nova condição. Já estava a algum tempo nesse mundo. Tempo o suficiente para entender como as coisas funcionavam. Qual era o tipo de “pessoas” que deveria ter por perto e de quais deveria se afastar. Sabia escolher seus amigos; Mas esses conhecimentos, do como sobreviver nessa pós vida não vieram apenas por vivencia. Encontrou vampiros mais antigos que ele que se dispuseram a apadrinhá-lo no momento em que se via mais vulnerável. Ensinaram sobre a vida nas sombras como se virar nela. Mas como Tristan bem sabia, entre vampiros nada é de graça. Ninguém te ajuda por ter ido com sua cara ou gostado do seu jeito.
Tudo tem um preço. O que lhe foi cobrado não era algo tão caro ou difícil, não tinha muito que reclamar quanto a isso. Fora recrutado para manter a “ordem” em uma área, e fazia aquilo com certo prazer. Sentia-se o manda chuva do pedaço, como nunca teve chance de se sentir quando ainda era um reles mortal assalariado, que tinha que viver se esgueirando sobre a aba do patrão cretino. Mas naquela noite era diferente. Sentia algo estranho no ar. Uma aura indescritível, pesada. Tristan esperava impacientemente por um vampiro novato que havia entrado em sua área e começado a por em risco o conveniente manto de anonimato que privilegia o bom caçador noturno.
Ninguém ainda havia visto o rosto do sujeito, mas a sujeira que ele deixava pelo caminho era digna de um carniceiro violento e pouco discreto, que via tanto prazer em deixar um circo armado para o publico da manhã quanto no ato de se alimentar em si. Seria algo normal para Tristan. Já havia se metido outras vezes com vampiros que se aventuravam em seus mares, mas algo estava fazendo seus sentidos apitarem como uma ambulância em emergência.
A frente da casa noturna estava consideravelmente movimentada e Tristan sabia que encontraria o intruso rondando por ali, afinal, era um ponto ótimo para se fazer vitimas incautas. O que teria que fazer nesta noite era simples: observar o alvo, seus movimentos, seu banho de sangue, o quão apurados eram seus instintos. O próximo encontro seria o ultimo.
De repente, Tristan sentiu uma presença. Forte, maligna, densa. Uma presença que fazia a própria noite ceder lugar para algo ainda mais obscuro. Seus olhos enrubesceram e sua visão se aguçou.
Olhou por todos os lados procurando sua presa. Nada viu, apenas sentiu aquela presença infernal, mas não conseguia distinguir de onde vinha. Decidiu disfarçadamente embrenhar-se na multidão e tentar encontrar seu recém anunciado rival. Pessoas de todos os lados, apenas gado. Tristan estava caçando, mas não conseguia visualizar sua presa, o que o deixava ainda mais ansioso. Logo precisaria de mais um cigarro. Era hora de rodear a danceteria, tinha certeza que aquele maldito ainda estava por perto, podia sentir aquela energia opressiva como se fossem chibatadas cruéis de um algoz invisível.
Não era momento para se perder a calma. Tristan se dirigiu a uma ruela na lateral da discoteca que terminava em uma enorme parede de concreto que fazia fundo a um terreno onde estavam sendo construídas casas populares. Caminhou até o fundo, encostou a mão no tijolo úmido, farejava algo estranho, algo que ainda não conhecia. Uma rajada forte de vento veio pelas suas costas e o fez virar arrepiando-se todo. Não pelo frio, pois seu corpo já não era mais vitimado por esse tipo de desconforto, mas sim pelo que viu surgir na escuridão. Um par de olhos que flamejavam como o inferno em uma altura pouco maior que a sua própria.
Estava tão próximo, mas nenhum de seus passos se fez ouvir enquanto se aproximava. Tristan podia ver pouca coisa alem da silhueta envolta em trevas de um ser “2 por 2” que parecia ter sido expulso do próprio inferno. Não podia acreditar, havia sido colocado naquela arapuca. Estava encurralado e pior, apavorado. Veio a mente que poderia ter fumado aquele cigarro que havia cogitado antes, talvez estivesse mais calmo agora. Não, nada que tivesse feito o teria preparado para aquilo. Outro vampiro vindo de sabe lá onde o emboscara como um rato e sentia-se pequeno e indefeso contra isso. O caçador havia virado a caça. Estes pensamentos correram em um átimo por sua mente.
Poucos segundos após ter vistos os olhos se acenderem a sua frente, garras selvagens e impiedosas arrancaram parte da carne de seu tronco, despedaçando costelas e pintando horrorosamente a parede lateral do beco. A outra mão da criatura prendeu-se em seu pescoço e ainda foi capaz de ouvir o som dos ossos se partindo, da traqueia se arrebentando com se fosse algo extremamente frágil. Em alguns segundos não passava de uma carcaça imóvel, inútil. Carne dilacerada e retorcida. O agressor sumiu tão rápido quanto apareceu, deixando os restos fétidos e ensangüentados de Tristan para serem pulverizados pela luz do dia. Como diz aquele ditado: Um dia é do caçador e o outro....
Fim
por: Ermes Le Fou

Um comentário:

  1. É Fascinante esse conto! O cara se achava o tal, mas tinha alguém maior. É assim na vida não é?

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